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Adolescente vende bala com o sonho de ir ao Mundial de Jiu-Jitsu

Kauã Reis sonha em disputar o mundial na Flórida em 2025. Foto: Reprodução/Instagram.

A meta de um lutador de Jiu-Jitsu é derrubar o adversário no tatame. Mas para o adolescente Kauã Reis, de 15 anos, a luta começa antes de vestir o kimono. Na transição da faixa verde para a azul, o jovem corre atrás de um sonho. Disputar o mundial da modalidade que acontece na Flórida, entre julho e agosto de 2025. Para isso, corre contra o tempo para conseguir o visto para os Estados Unidos.

A forma como o adolescente aborda as pessoas para vender as balas é diferente. Ao invés de insistir no pedido, ele mostra parte das medalhas que conquistou para garantir que o cliente que for comprar os doces vai ajudá-lo.

Morador da Covanca, comunidade localizada entre Tanque e Praça Seca, em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio, Kauã não teme ser vítima de assalto por causa das medalhas. Ele começou a praticar a luta aos 10 anos e, desde então, conquistou 33 medalhas ao todo: 18 de ouro, 9 de prata e 6 de bronze. Destas, há até conquistas internacionais, como duas medalhas douradas em duas edições do International Kids. Uma em São Paulo e a outra em Florianópolis. Ambas as competições são da Federação Internacional de Jiu-Jitsu Brasileiro, a IBJJF (International Brazilian Jiu-Jitsu Federation, em inglês).

Luta aproximou pai e filho

O pai de Kauã, Sílvio Reis, de 50 anos, também é lutador de Jiu-Jitsu e é o treinador do jovem. Praticante há 14 anos, o sensei é faixa-preta quarto grau. Em conversa com a Folha do Leste, ele explicou que a luta o aproximou do filho, de quem não era tão próximo por ter se separado da mãe dele.

“Na verdade, por eu e a mãe dele sermos divorciados, confesso que fiquei um pouco ausente do Kauã na infância. Até que um dia, ele me falou que gostaria de aprender Jiu-Jitsu. Resolvi ensiná-lo e em pouco tempo ele mostrou ter muito foco para se desenvolver em um grande lutador”, recorda.

Reis afirma que, inicialmente, matriculou o filho em um projeto social na Gardênia Azul, também em Jacarepaguá. Entretanto, a falta de oportunidades para ele disputar competições o fez pensar em mudar de projeto. Reis optou pela mudança e em pouco tempo o resultado apareceu. Kauã passou a competir representando essa nova instituição e as conquistas vieram.

Kauã venceu o International Cup de Saquarema em dezembro de 2023. Foto: Reprodução/Instagram

Reação ao descobrir a venda das balas

O pai admite que se surpreendeu ao ver o filho tomar a iniciativa. E afirma se orgulhar muito do gesto do adolescente.

“Confesso que quando ele me falou que vendia bala, me surpreendi. Ele é tímido e tem a rotina bem regrada. É treino, escola e casa. Mas vê-lo tomar essa atitude me surpreendeu demais e aumentou o meu orgulho dele”, reconheceu.

Kauã afirma que tomou a iniciativa por conta própria.

“A ideia de vender bala para conquistar meu visto americano surgiu de uma iniciativa minha, quando percebi que não teria a ajuda de ninguém para realizar meus sonhos, a não ser o apoio da minha família”, afirmou o adolescente.

Vendendo as balas no calçadão da Praia da Barra, também na Zona Oeste, o jovem lutador explica que as reações variam entre quem o vê com as medalhas e as balas.

“Tem pessoas que ficam bastante interessadas nas medalhas, algumas de coração bom, que ajudam e incentivam, mas também tem pessoas que, quando me veem com os doces, atravessam a rua. Algumas fingem não me ouvir quando tento abordá-las, e outras são bem ignorantes, o que desanima bastante”, contou.

Dificuldades por causa da violência e perrengues em Florianópolis

Reis conta que chegou a ter um comércio de conserto e venda de acessórios para aparelhos celulares na Gardênia, mas a violência que afeta a região o obrigou a parar com o comércio. Por isso, ele projeta dar aulas particulares para ajudar financeiramente os planos do filho.

“Infelizmente, tive que parar com um comércio que tinha de conserto para celulares por causa da violência. Até por isso, pago com muita dificuldade o aluguel da loja. Então busco outras alternativas para conseguir ajudar o Kauã nos custos para participar de competições. Penso em dar aulas particulares de Jiu-Jitsu para conseguir levantar alguma verba”, revela.

O pai recorda que não é de hoje que ambos já passaram por situações difíceis. Uma delas foi justamente na conquista do Internacional Kids de Florianópolis, em Santa Catarina.

“Certa vez, ele me disse que gostaria de competir em Florianópolis. Disse que não tinha dinheiro. Quando faltavam duas semanas, cheguei até ele e perguntei: ‘Você quer realmente competir lá em Floripa?”, ao que o Kauã me confirmou. Arranjei o dinheiro com muita dificuldade e fomos só com a passagem de ida”, recorda.

Percalços como motivação

A partir disso, pai e filho enfrentaram alguns percalços. O primeiro foi uma diarreia intensa que ambos tiveram. Por causa do pouco dinheiro, o pai fez sanduíche natural para que eles se alimentassem na viagem. O problema é que quando chegaram em Santa Catarina, os dois passaram mal do estômago. Além disso, Kauã mal conseguiu dormir por causa da fraqueza causada pela intensa dor de barriga. Apesar disso, a situação deu mais motivação ao adolescente.

“Passamos muito mal durante a madrugada. Ele nem dormiu direito. Eu dava soro para ele não desidratar. No dia seguinte, apesar de tudo isso, ele foi lá e foi campeão. Só que não tinha dito que só estava com a passagem de ida. Pra voltar foi um sufoco, mas demos um jeito e conseguimos”, recorda aos risos.

Inspirações e esperança

Kauã vende as balas na praia da Barra da Tijuca, na Zona Oeste. Foto: Kauã Reis.

Kauã vai competir na categoria Juvenil I até 69 kg, que é voltado para quem tem até 16 anos, idade que vai completar em 2025. Tendo domo referências os lutadores Jansem Gomes (Jiu-Jitsu) e Charles Oliveira, o Charles do Bronx (UFC), o adolescente acredita que uma boa colocação vai ajudá-lo a crescer no esporte.

“O que mais me motiva a continuar nessa luta para ir ao Campeonato Mundial é saber que, se eu ganhar, muitas portas se abrirão para que eu consiga seguir meu sonho e conquistar uma bela carreira, pois o Campeonato Mundial é o maior campeonato de jiu-jitsu do mundo”, afirmou em tom de esperança.

Caso alguém queira ajudá-lo, doações via PIX podem ser feitas pela seguinte chave: badboycel295@gmail.com, no nome de Silvio de Carvalho Reis, banco Nubank.

 

 

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