A morte de Angela Ro Ro: cantora de “Amor, meu grande amor” morre aos 75 anos
Do fim até o começo, sem hora marcada, a música brasileira fica mais pobre com a morte da cantora Angela Ro Ro, nesta segunda-feira (8), aos 75 anos, no Rio de Janeiro. A cantora sofreu uma parada cardíaca após um procedimento cirúrgico. Internada desde julho no Hospital Silvestre, no Cosme Velho, Zona Sul da cidade, enfrentava complicações de saúde após uma infecção no pulmão que exigiu traqueostomia.
A notícia foi confirmada por Laninha Braga, ex-namorada que cuidava dela nos últimos meses, e pelo produtor Paulinho Lima, amigo de longa data.
Uma vida em estado de música
Nascida Angela Maria Diniz Gonsalves em 5 de dezembro de 1949, no Rio, ganhou o apelido Ro Ro ainda menina por causa da voz rouca e grave. Nos anos 1970, iniciou carreira após viver em Londres, onde trabalhou como garçonete, lavadora de pratos e faxineira. Nos pubs, cantava quando podia. Glauber Rocha a apresentou a Caetano Veloso e, em 1971, tocou gaita no álbum Transa.
De volta ao Brasil, assinou contrato com a Polygram/Polydor e, em 1979, lançou seu primeiro álbum, inteiramente autoral. Dele nasceram canções como “Amor, meu grande amor”, “Tola foi você”, “Balada da arrasada” e “Agito e uso”, que marcaram gerações.
Escândalo e estética
Ro Ro se fez ouvir numa época em que o moralismo insistia em calar vozes como a sua. O disco Escândalo! (1981), com faixa-título de Caetano, foi símbolo de uma artista que jamais se curvou à hipocrisia. Outros álbuns, como Só nos resta viver (1980), A vida é mesmo assim (1984) e Eu desatino (1985), reforçaram sua posição como uma das intérpretes mais intensas do Brasil.
Na virada do milênio, após abandonar drogas, álcool e cigarro, reinventou-se com Acertei no Milênio (2000), celebrando a sobrevivência. Nos anos seguintes, apresentou o talk-show Escândalo, no Canal Brasil, e lançou discos como Compasso (2006), Feliz da vida! (2013) e Selvagem (2017).
Existência à flor da pele
Angela viveu à beira do abismo, mas nunca perdeu a coragem de transformar tragédia em arte. Em rede social, expôs fragilidades ao pedir ajuda financeira. “Sem perspectiva de alta ou cura para trabalhar, humildemente peço ajuda a vocês”, escreveu em uma de suas últimas mensagens.
Com humor ácido, ironia e intensidade emocional, Ro Ro se tornou uma voz que ecoava para além da música. Seu canto falava de amor, desamor, ruína e reconstrução.
O legado de um escândalo
O Brasil se despede de Angela Ro Ro, mas sua obra permanece. Ela deixa não apenas discos, mas uma lição de autenticidade existencial. Viveu sem filtros, ao mesmo tempo que gargalhou das próprias quedas e transformou cada dor em melodia.
Na morte de Angela, resta, em suma, a certeza de que amar, como ela cantava, continua sendo a mais escandalosa das revoluções.