A ex-presidente da escola de samba Acadêmicos do Salgueiro, Regina Celi, estava na mira da morte. Ela esteve no radar dos ex-policiais envolvidos no brutal assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Desse modo, o jogo do bicho entra em cena no caso Marielle, com seus bastidores. Regina Celi presidiu o Salgueiro de 2008 a 2018. Nesse período, contou com o apoio de Shanna Garcia, inimiga de Bernardo Bello.
O fato se tornou público neste domingo (24), com a quebra do sigilo do inquérito da Polícia Federal, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Atualmente, Regina ocupa a presidência de honra da Unidos de Padre Miguel, agremiação que ascendeu ao grupo especial, ligada ao ex-traficante Celsinho da Vila Vintém.
Ronnie Lessa, o executor de Marielle, monitorou Regina e Marielle . O ex-policial chegou a seguir Regina Celi com o mesmo carro usado na execução da vereadora. Porém, pelo que chamou de “problemas de logística”, o assassinato não se concretizou.
Em sua delação premiada, Lessa afirmou que, inicialmente, recusou a proposta de assassinar Regina, pois o pagamento para matar Marielle era mais vantajoso. No entanto, ele acabou cedendo diante da pressão de Bernardo Bello, ex-marido de Tamara Garcia e filha do bicheiro Maninho, assassinado em 2004. Bello assumiu parte do espólio da família na loteria zoológica, principalmente na Zona Sul.
Segundo o inquérito, Bernardo prometeu a Ronnie uma generosa recompensa mensal.
Motivação
A encomenda do assassinato de Regina surge em 2017, cujo enredo remonta a disputa pela presidência do Salgueiro. Entretanto, Regina se reelegeu para mais um mandato, em 2018. Ela enfrentou protestos de André Vaz, que, em tese, defenderia os interesses de Bernardo Bello. Com a impugnação da eleição de Regina pela Justiça, ainda em 2018, André Vaz chegou à presidência do Salgueiro. Desde então, ocupa o cargo.
O plano de execução de Regina falhou devido à constante mudança de local onde o carro estava estacionado, o que impediu a concretização do crime. A PF aponta que a ordem para matar Regina, assim como a de Marielle, teria partido de Bernardo Bello, atualmente foragido da Justiça.
Para complicar ainda mais a trama, o ex-policial Élcio de Queiroz deduziu, em sua delação, que a ordem para matar Marielle teria vindo de Bernardo Bello, Em suma, Élcio se baseou em conversas ouvidas no réveillon de 2018. Ronnie Lessa teria reclamado do desempenho de Suel como motorista durante uma tentativa de assassinato encomendada pelo bicheiro.
Lessa sempre teve laços com o bicheiro Rogério Andrade, inimigo de Bernardo Bello. Em suma, a relação do matador de aluguel com o principal rival de um aliado, surpreendeu a muitos. Inicialmente, algumas teorias investigativas chegaram a relacionar Rogério Andrade ao crime de Marielle.
Família Garcia
Desde a morte de Maninho, em 2004, a disputa por territórios do jogo do bicho até então controlados pelos Garcia se tornou um problema dentro da própria família.
As irmãs gêmeas Tamara e e Shanna, que sempre viveram uma relação de ódio, entregaram aos seus então maridos, Bernardo e Zé Personal, respectivamente, a gestão de suas “heranças”. Contudo, alheio à briga das irmãs, estava o Waldomiro Paes Garcia Júnior – Mirinho Garcia, assassinado em 2017, após sofrer um sequestro. Jamais houve consenso.
Zé Personal morreu assassinado, em 2010. Nesse ínterim, Bernardo Bello teria assumido o controle total do espólio da família. Mas Shanna resolveu enfrentar o cunhado e a irmã. Teve apoio do novo marido, o empresário Rafael Alves, que chegou a ser preso em 2020, acusado de chefiar o “QG da Propina”, dentro da Prefeitura do Rio, na gestão Crivella.
Em 2018, Bernardo Bello assumiu a presidência da Unidos de Vila Isabel, ao passo que, no ano seguinte, Shanna Garcia sofreu um atentado a tiros, na Barra da Tijuca. Atualmente, Bello está foragido.
Toda essa trama macabra envolve ainda o assassinato do também bicheiro Alcebíades Paes Garcia, o Bid, irmão de Waldemir Paes Garcia, o Maninho, em 2020.
Bernardo Bello x Rogério Andrade
A contenda entre os bicheiros se dá por uma disputa de territórios, que antecede a morte de seu ex-sogro, pois Maninho entrou em confronto com Rogério Andrade disputando pontos de jogo na Zona Oeste.
Cogita-se que a beligerância entre ambos se dá em continuação da disputa, principalmente com a tentativa de contra-ataque de Rogério Andrade para avançar na Zona Sul, em territórios lotéricos ilegais da família Garcia.