O empresário Felipe Neto confessou, nesta sexta-feira (4), que enganou a nação ao anunciar, no dia anterior, sua suposta candidatura à presidência da República. O fez com gargalhadas, como se a dor democrática fosse espetáculo de stand-up, como se o destino político do Brasil fosse um reality show promocional para seu próximo lançamento.
“É óbvio que eu não vou me candidatar a coisa alguma”, disse, desdenhando da inteligência coletiva, reduzindo o debate público a mera ferramenta publicitária.
Assim como o “Ministério da Verdade”, na obra 1984, de George Orwell, Felipe Neto criou sua própria realidade, alterou os fatos, reverteu narrativas e reescreveu a verdade em prol de uma única figura: ele mesmo. A “candidatura” era falsa, a rede social era fictícia, a intenção era comercial — e o público, mais uma vez, foi reduzido a mero objeto de engajamento.
Num tempo em que o Brasil ainda lambe as feridas dos ataques de 8 de janeiro, e enquanto a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal julga um dos maiores atentados contra o Estado Democrático de Direito, o jogo cínico de Felipe Neto exala mau gosto, desprezo institucional e vaidade em graus industriais.
Não, a mentira de Felipe Neto não é crime. Mas é um insulto. Uma agressão à esperança, um tiro nas costas de uma sociedade que luta para recuperar sua fé no debate político honesto.
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Sua “ação de marketing” não inova, não revoluciona, não desperta — apenas distorce. Transforma o sonho democrático em propaganda. Felipe Neto, que tanto se diz crítico dos políticos tradicionais, agora comete um gesto que supera a insensibilidade deles. Ao menos, alguns destes, não usam a mentira como estratégia publicitária.
Sua postura econômica em empatia e generosa em autoengano faz lembrar o Narciso mitológico: apaixonado pelo próprio reflexo, ignorou o lago onde se afogava.
A quem interessa uma candidatura que nunca existiu? A quem serve um discurso fantasioso disfarçado de provocação? Ao mercado de curtidas, à indústria da auto-referência, à manutenção do ego, tão gigante quanto sua falta de responsabilidade.
O dever da imprensa não é amplificar gracejos com rastros de dano coletivo. É denunciar quando a verdade é violada, sobretudo por aqueles que se escondem sob a máscara do “engajamento do bem”.