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Secretária de Saúde aciona justiça para silenciar vereador

Vereador Douglas Gomes | Reprodução

 

O vereador Douglas Gomes (PL) afirma estar sendo vítima de tentativa de cerceamento de atividade parlamentar e violação de suas prerrogativas, pela secretária municipal de Saúde, Anamaria Schneider. Segundo o parlamentar, ele estaria impedido de fiscalizar os atos praticados pela então gestora da pasta da Saúde em Niterói, que pleiteia na justiça o bloqueio de R$ 928 mil em suas contas bancárias. A questão está relacionada a declarações feitas em plenário e publicações feitas em redes sociais por Gomes, e consideradas ofensivas e mentirosas por Schneider, que foi à Justiça, e chegou a conseguir uma decisão impedindo o vereador de falar sobre ela.

Segundo Douglas Gomes, “a imunidade parlamentar deve ser suficiente para garantir a preservação do Poder Legislativo de um Estado Democrático de Direito”. Ele diz que a ação é uma tentativa de lhe calar e parar seu trabalho enquanto fiscalizador.

O Judiciário não deve ser o caminho para coibir excessos de parlamentares, uma vez que qualquer excesso cometido por parlamentares no exercício de suas funções deve ser tratado pelo próprio Poder Legislativo – afirmou.

Douglas afirma ainda que a função principal do vereador” é fiscalizar as ações do Poder Executivo Municipal”. Incluindo, dessa forma, os secretários nomeados pelo prefeito.

Poder Legislativo

De acordo com o presidente da Câmara, vereador Milton Cal (Progressistas), Douglas Gomes “tem o direito de falar em plenário”.

 

Imunidade do vereador

De acordo com a advogada Damiane Arruda, especialista em direito público e consultora jurídica do FOLHA DO LESTE, a Constituição Federal, em seu artigo 29, inciso VIII e jurisprudência do STF, assegura aos vereadores inviolabilidade por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do município.

A advogada Damiane Arruda – Foto: Arquivo pessoal

Este caso ultrapassa todo o ordenamento jurídico em relação a independência dos poderes, ou seja, um poder não pode interferir no outro, conforme dispõe a Constituição Federal em seu art. 2º. Não pode um juiz usar a toga para calar um parlamento eleito, tendo este o direito de se manifestar em qual esfera for, sempre buscando a harmonia entre os limites legais.

Não vivemos numa ditadura, o vereador tem voz e foi eleito para proteger os direitos dos cidadãos, quando ele é calado, milhões de pessoas estão sendo caladas. Por isso é preciso manter acesa a legislação para coibir enfrentamentos de outros poderem que queiram intervir na esfera legislativa, usando a liberdade de expressão como tema central.

Salienta-se que esta proteção adicional aos vereadores, chamada de imunidade material, é relacionada a manifestações referente ao mandato. Quando acarretam ofensas a alguém, pode caracterizar crime, afirma.

 

A questão na justiça

A contenda teve início em julho do ano passado, em razão de uma publicação feita pelo vereador, em uma rede social, afirmando que o então deputado federal Chico D’Ângelo (PDT) “colocou” a esposa Anamaria como presidente da A Fundação Estatal de Saúde de Niterói (FeSaúde), entre outros argumentos usados pelo parlamentar, como o fato dela ter gerido uma organização social (OS) antes de assumir o cargo. Por essa razão, Anamaria moveu ação judicial contra Douglas Gomes. E argumentou que a publicação feita pelo vereador continha inverdade, “já que sua indicação se deu por mérito”, e “gerou constrangimento junto ao seu meio”.

Anamaria Schneider | Reprodução

Assim sendo, obteve decisão liminar em seu favor, na 7ª Vara Cível da Comarca de Niterói. A Juíza Andréa Gonçalves Duarte Joanes determinou que a publicação fosse apagada, sob pena de multa no valor de R$ 5 mil por dia. Tal feito ocorreu em 22 de setembro de 2022. Inicialmente, na mesma ação, Anamaria também pedia a condenação de Douglas ao pagamento de R$ 50 mil, a título de danos morais.

Douglas Gomes não cumpriu a decisão judicial. Alegou, em 20 de outubro do ano passado, não ter sido citado regularmente. A justiça reconheceu o argumento de ausência de citação do parlamentar. Após isso, Gomes apresentou contestação. Preliminarmente, pediu a extinção do processo sem julgamento do mérito por falta de possibilidade jurídica do pedido, bem como de interesse de agir, considerando sua qualidade de parlamentar eleito.

“(Anamaria) requer a censura e condenação por dano moral de um parlamentar eleito e que não violou com suas falas e tampouco atacou o Estado, a Democracia, ou as instituições, logo se trata de um pedido impossível, por ser ilegal e inconstitucional, diante do que reza a Constituição e as decisões dos Tribunais”

Sanção Majorada

Após um intenso fluxo de petições, despachos e decisões interlocutórias apenas relacionadas ao andamento do feito, em 23 de agosto deste ano, o juízo da 7ª Vara Cível de Niterói entendeu que o autor descumpriu a decisão liminar de 22/09/22. Dessa forma, determinou a ampliação dos efeitos da tutela concedida, “de modo que o réu seja impedido de publicar qualquer conteúdo, de qualquer natureza, que envolva o nome ou o cargo da autora, sob pena de multa de R$8.000,00 (oito mil reais) pelo descumprimento”. Também ficou determinado que Douglas Gomes diversas publicações sobre Anamaria. Isso, em ato decisório da magistrada Juliane Mosso Beyruth de Freitas Guimarães.

Segunda Instância

Tal decisão se tornou objeto de agravo de instrumento de Douglas Gomes.

 

Pretende o Agravante a reforma da decisão, com o fim de reconhecer sua prerrogativa de imunidade parlamentar, previsto no art. 29, inciso VIII da Constituição Federal, em especial sobre seus discursos e opiniões, sendo tal matéria ignorada até então pelo d. juízo de origem . Em grave violação ao direito constitucional do vereador, o juízo a quo deu uma decisão teratológica, cerceando a liberdade de expressão de um parlamentar eleito, bem como ignorando totalmente sua imunidade parlamentar. Veja que a decisão chega ao absurdo de impedir o vereador de publicar qualquer conteúdo, de qualquer natureza, que envolva o nome ou o cargo de uma secretária municipal, sob pena de multa de R$ 8.000,00 (oito mil reais) .

 

Segundo o parlamentar, o processo em curso tem por objetivo cercear sua liberdade de expressão. Ele alegou, também, que o tio da Juíza que preside o caso, especificamente irmão de sua mãe, “desfrutou de cargos comissionados na Prefeitura de Niterói, sob a administração de um grupo político ao qual é declaradamente de oposição”. Por essa razão, pediu a suspeição da juíza. Do mesmo modo, arguiu, também, a suspeição da Juíza Andréa Gonçalves Duarte Joanes, alegando que a mesma teria uma parente nomeada em um cargo em comissão.

Suspeição

Diante da alegação de suspeição das magistradas, a Vigésima Primeira Câmara de Direito Privado, por decisão da Desembargadora Mafalda Lucchese, pediu explicações ao Juízo da 7ª Vara Cível de Niterói.

A magistrada Juliane Mósso Beyruth de Freitas Guimarães reconhece a relação de parentesco, com o tio citado por Douglas Gomes. Contudo, afirma que não possui qualquer interesse no julgamento do processo em favor ou contra quaisquer das partes.

“Com relação à alegação de parentesco com o sr. Reinaldo, suposto opositor político do demandado, esta magistrada esclarece que, de fato, vem a ser sua sobrinha. Contudo, tal fato, por si só, não compromete de forma alguma a sua imparcialidade. Em exercício da Magistratura há quase vinte anos, esta magistrada não permitirá que qualquer pessoa venha a ofendê-la, tampouco a apontar qualquer falha de conduta moral ou profissional, mormente envolvendo uma pessoa que nada tem a ver com o exercício da sua profissão. A pessoa desta magistrada não se confunde, de forma alguma, com a pessoa de um familiar cujo convívio social se restringe a uma vez por ano em compromissos formais de família. Ora, trata-se de pessoa aparentemente conhecida na cidade, que já exerceu a Presidência de seccional OAB em tempos remotos, pelo que é possível que algumas pessoas façam ilações levianas e, eventualmente, caso descontentes com o resultado de algumas demandas, tentem atribuir conotações políticas a decisões que lhes são incômodas usando como subterfúgio um mero sobrenome. Tais ilações incomodam sobremaneira esta magistrada, que sempre exerceu o seu ofício com imparcialidade e amor, de forma totalmente alheia a questões políticas. Cumpre salientar que esta juíza não tem qualquer controle sobre tais comentários e, se partirmos da linha de raciocínio do demandado, que fulcra a sua acusação apenas no parentesco existente, não há sequer como se defender, já que família lhe é imposta e não escolhida. Outrossim, também não tem conhecimento da vida profissional atual do seu tio, tampouco de suas amizades e eventuais inimizades, sequer sabendo informar se ainda exerce algum cargo na Prefeitura. Por fim, observo que o demandado também dirigiu a exceção de suspeição à nobre colega que antecedeu a signatária, ao argumento de que ela “pode” ter parentes ligados ao suposto grupo político. Ora, tais ilações aleatórias indicam que, somente agora, na fase final do processo, que já se encaminha para a prolação de sentença, o demandado passou a distribuir acusações às magistradas para as quais o processo foi regularmente distribuído, sem embasamento sério, ao invés de dirigir o seu foco para o manejo do recurso adequado.”

 

Por fim, a Juíza determinou, no último dia 15, a atuação, em apartado, da exceção de suspeição, para apreciação pela Desembargadora, em segunda instância.  E manteve sua última decisão, pelos seus próprios fundamentos.

 

 

Bloqueio de R$ 928 mil

Os novos pedidos de Anamaria, formulados no último dia 19, consistem no aumento para R$ 10 mil por dia da multa imposta a Douglas Gomes, bem como que ele seja compelido a remover as publicações em que veicula notícias falsas sobre a autora constantes nos links que menciona.

Pede, ainda, a manutenção das decisões anteriores para que Vereador-Réu seja impedido de publicar qualquer conteúdo, de qualquer natureza, que envolva o nome ou o cargo de Anamaria Schneider. Além disso, o arbítrio de multa pelos atos atentatórios à dignidade da justiça bem como a expedição de ofícios aos provedores de aplicações que hospedam tais conteúdos, para que estes realizem a imediata retirada dos “conteúdos manifestamente abusivos” do ar.

Roga, ainda, pelo envio de ofício ao Ministério Público com cópias do processo, para que haja o oferecimento de denúncia pelo crime de desobediência.

 

 

 

 

 

 

 

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