
Foto: AFP
O Decreto de Necessidade e Urgência (DNU) emitido pelo recém-empossado presidente da Argentina, Javier Milei, com o objetivo de desregulamentar a economia do país, será alvo de resistência tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado, além de enfrentar questionamentos judiciais e protestos populares. Essa é a análise do economista e historiador Osvaldo Coggiola, argentino e professor de história contemporânea na Universidade de São Paulo (USP).
Segundo Coggiola, as medidas anunciadas pelo novo presidente contrariam a Constituição e o Código Penal argentino. Ele prevê que haverá ações judiciais, ações parlamentares e uma profunda crise política.
Apesar do objetivo de diminuir a participação do Estado na economia e flexibilizar as normas regulatórias, o acadêmico argumenta que o decreto não estimulará imediatamente os investimentos. Coggiola ressalta que Milei precisará, antes de atrair um fluxo sólido de investimentos, demonstrar estabilidade política e apoio parlamentar, ou então sustentar um governo baseado em decretos e não em leis.
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Embora Milei tenha sido eleito com mais de 14 milhões de votos, representando mais de 55% do eleitorado, seu partido, Liberdade Avança, possui apenas 39 dos 257 deputados e sete dos 72 senadores. O governo conta com o apoio de outras legendas, como o partido “Juntos por el cambio”, do ex-presidente Mauricio Macri, que possui 92 deputados e 24 senadores, além de alguns pequenos partidos, formando uma maioria frágil diante da coalizão peronista “Unión por la Patria”, que tem 105 deputados e 33 senadores.
No processo de elaboração do DNU, Milei precisou retrair-se em relação a medidas como a redução de impostos e a isenção de contribuição previdenciária para as empresas, devido às divergências dentro de seu gabinete. Essas medidas reduziriam a arrecadação tributária, agravando o déficit público e prejudicando a capacidade de cumprir acordos internacionais de empréstimo.
Outro desafio a ser enfrentado por Milei é a inflação. Com a depreciação maciça da moeda promovida anteriormente, os preços, especialmente dos alimentos, têm subido mais rapidamente do que os salários dos argentinos. A desregulamentação do comércio pode resultar em preços internos determinados pelo mercado internacional, ultrapassando o poder de compra dos cidadãos do país.
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Poucas horas após a publicação das medidas, movimentos sociais convocaram panelaços e manifestações nas principais avenidas de Buenos Aires, dirigindo-se à Plaza de Mayo para protestar contra as medidas estabelecidas pelo DNU.
O decreto possui 336 artigos e afeta diversos setores da atividade econômica. Entre as medidas estão a revogação da legislação que impedia a privatização de empresas estatais, como a petrolífera YPF; a transformação de todas as empresas públicas em sociedades anônimas; a autorização para a transferência de ações da Aerolíneas Argentinas SA aos funcionários; a liberação de exportações e importações; alterações no marco regulatório de medicamentos; e a desregulamentação dos serviços de internet via satélite.
O governo argentino tem um prazo de dez dias úteis para enviar o decreto à Comissão Permanente Bicameral de Processo Legislativo do Congresso Nacional, que é formada por deputados e senadores. A comissão, por sua vez, tem o mesmo prazo para emitir um parecer sobre a validade do decreto e enviar às duas casas do Congresso.
A norma não pode ser alterada pelo legislativo, apenas aprovada ou rejeitada. Para a aprovação, é necessário o aval de uma das casas do Congresso.