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Jornalistas opinam sobre a cobertura de carnaval da Globo

Foto: Reprodução

Os desfiles na Avenida Marquês de Sapucaí terminaram. Agora, a expectativa é saber quais escolas serão campeãs do Grupo Especial e da Série Ouro. Mas uma unanimidade é certa: a transmissão da TV Globo no carnaval carioca foi desastrosa.

Em diversas publicações no X e em respostas de postagens no Instagram e Facebook, podemos encontrar com facilidade inúmeras críticas à opção da emissora em escalar influenciadores para trabalharem como repórteres. Por isso, o Folha do Leste conversou com alguns jornalistas que trabalharam por anos na Sapucaí para entender quais foram as falhas que o canal cometeu e como deve ser uma cobertura jornalística da folia.

A reportagem conversou com Bárbara Alejandra, Marcelle Chagas, Sandro Nascimento e Sidney Rezende. Todos unânimes em um aspecto: a cobertura jornalística do carnaval tem que ter responsabilidade. Logo, faz-se essencial o repórter estar bem preparado para passar a notícia com precisão ao telespectador.

Morando em Florianópolis, em Santa Catarina, Bárbara acompanhou os desfiles pela televisão. Com a experiência de quem atuou como fotojornalista na Sapucaí por 20 anos, ela percebeu de cara erros que considerou inaceitáveis.

“O desfile das escolas de samba contam uma história desde a comissão de frente até a última ala. Se isso não é mostrado falta um pedaço do enredo. A transmissão deixou de mostrar muita coisa, como a ausência da comissão de frente. Deixou de mostrar detalhes dos carros e os problemas, como a mulher
que caiu do carro alegórico da mangueira na dispersão. O Escobar disse que não sabia o que estava acontecendo e ficou visivelmente perdido”, exemplifica.

Crítico de televisão do site NaTelinha, Sandro Nascimento cobriu o carnaval carioca por dez anos. Ele concorda com Bárbara e explica que a transmissão não mostrou justamente os detalhes que o público mais gosta de saber.

“Os telespectadores adoram assistir às inovações da comissão de frente das escolas, o desenvolvimento do mestre-sala e porta-bandeiras, bem como a presença dos famosos nos desfiles. Além disso, gostam de ser informados se algo errado aconteceu durante a passagem da escola. Esses são os itens básicos para uma transmissão cativante e envolvente”, acrescenta.

Sidney Rezende trabalhou por 20 anos no Grupo Globo e criou o portal SRzd.com em 2007 com o intuito de fazer uma cobertura de carnaval que fosse mais ampla e não se restringisse apenas ao período de folia. Ele opina que o canal assumiu um risco ao não juntar a juventude das redes sociais com a experiência de quem tem conhecimento nesse tipo de cobertura:

“Ao abrir mão da expertise histórica e tradicional do seu departamento de jornalismo ela foi para o risco. Ao embarcar nessa onda de que os ‘expoentes da internet’, gente do esporte e talentos do entretenimento por si só são capazes de realizar uma cobertura de qualidade voltada para a TV é um engano. Pagou-se o preço da ‘inovação’ simplesmente por virar as costas para quem tem a experiência. O ideal seria combinar gente de cabelos brancos com o que há de mais divertido na geração Tik Tok. O combinado seria o sushi perfeito.  Um sem o outro aumenta-se muito o risco de dar errado. E deu!”, afirmou.

Falta de preparo e ausência de profissionais que poderiam fazer a diferença

Marcelle Chagas cobriu ininterruptamente o carnaval pela Rádio Roquette Pinto 94, 1 FM, do Rio de Janeiro, de 2011 a 2017. Para a jornalista, o que a Globo fez em 2024 é um mau sinal. O de que repórteres especializados são descartáveis.

“A Globo, ao agir assim, passa o seguinte recado: ‘Não precisamos de profissionais para cobrir o carnaval’. E soma-se a isso o fato de muitos veículos de imprensa, de uma forma geral, não demonstrarem interesse em fazer um investimento em jornalistas capacitados, aqueles que fazem a diferença. Embora tenha percebido um esforço da Globo em ampliar a diversidade de contratados para a transmissão do evento, creio que existem muitas pessoas qualificadas e pertencentes a diversos grupos sociais que têm experiência para darem conta do recado. Uma coisa não exclui a outra”, alerta.

Nessa linha, Bárbara afirma compreender que as redes sociais precisam ter voz ativa. Mas salienta que os jornalistas precisam estar presentes.

Tirar um profissional que estudou e tem o conhecimento por uma pessoa que não sabe do assunto não tem como dar certo. A transmissão precisa de jornalistas. O erro gritante e o pior de todos é que o espetáculo não teve problemas, foi tudo perfeito, assim como é nas redes sociais dos influenciadores”, opina.

Rezende cita que uma cobertura de qualidade tem que ter o diferencial, aquilo que os outro veículos não noticiam.

“A falta de informação sobre o assunto tratado ou a ignorância na identificação do que é fato relevante pode levar a novidade a parecer com aves que possuem voo de galinha. Para ser falcão é preciso ver na frente. Nosso conceito está expresso no primeiro editorial de apresentação quando estreamos há quase 18 anos: “um olhar diferente” e publicar o que os outros não dão”, argumenta.

Nascimento compara a transmissão da Série Ouro pela Band com o que a Globo exibiu no Grupo Especial. Para o jornalista do Na Telinha, a Band acertou com uma fórmula básica: fazer o simples.

“O Carnaval de 2024 marcou a pior transmissão da Globo em 40 anos de Sapucaí. A grande diferença entre a Band e a Globo foi que a emissora carioca tentou inovar na cobertura. No entanto, ao tratar os desfiles apenas como entretenimento, esqueceu-se de que também se trata de uma competição acirrada. O telespectador anseia por entender por que sua escola não é cotada para vencer os desfiles. Enquanto isso, a Band seguiu a tradição, oferecendo uma cobertura sólida e bem temperada, como um bom arroz com feijão”, afirma.

Repercussão nas redes sociais

Nas redes sociais, diversos profissionais se manifestaram sobre a transmissão. A jornalista Lia Rangel trabalhou por anos como assessora de imprensa de escolas como Unidos da Tijuca, Renascer de Jacarepaguá e Acadêmicos do Cubango, por exemplo.

Trabalhando no momento como diretora de marketing de uma construtech, na cidade de São Paulo, Lia publicou em seu perfil no Facebook o que achou da transmissão.

Foto: Repdução/Facebook.

Quem também não economizou nas críticas foi a repórter Cristina Serra, que trabalhou na Rede Globo por 26 anos.

Foto: Reprodução/Facebook

Atual apresentadora do RJ2, da Rede Globo, Ana Luíza Guimarães postou no Instagram estar com “saudades” de trabalhar no carnaval. Curiosamente, a publicação acontece um dia após internautas criticarem a emissora.

Foto: Reprodução/Instagram

Embora não tenha comentado sobre a decisão da emissora em tirar os repórteres da cobertura, a publicação da jornalista conta com manifestações duras de internautas.

Foto: Reprodução/Instagram

Foto: Reprodução/Instagram

Arrogância 

Em entrevista à Veja, o diretor da transmissão, José Bonifácio de Oliveira, o Boninho, afirmou não se importar com as críticas.

“Eu sou o diretor, estou amando tudo. Não estou nem aí para as críticas”, respondeu.

Mas, de acordo com o repórter da Rádio Tupi, Fred Soares, a situação não é de tranquilidade nos corredores da Globo.

Diante de tanta repercussão, como o canal vai agir em 2024? Sandro Nascimento acredita que a Vênus Platinada terá outra postura.

“A Rede Globo sempre foi referência de qualidade na TV. No entanto, o que se viu neste Carnaval foi um flerte com a tentativa de desconstruir essa imagem no mercado. Acredito que a emissora deverá rever suas estratégias. Afinal, nenhuma marca deseja ser associada a um produto de qualidade duvidosa, como foi exibido em 2024”, opinou.

 

 

 

 

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