Descontos não autorizados no INSS surgiram como foco de investigação da Controladoria-Geral da União (CGU), revelando concentração elevada no interior do Nordeste. Um relatório, produzido em junho de 2024, foi incorporado à apuração da Polícia Federal, que desencadeou a Operação Sem Desconto na semana passada.
De acordo com as investigações, os valores descontados sem consentimento de aposentados e pensionistas do INSS podem atingir R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024. A análise aponta que cidades do Maranhão e do Piauí registraram a maior incidência proporcional.
Segundo a CGU, 19 municípios apresentavam mais de 60% dos beneficiários com descontos associativos em março de 2024. Ribeirão Gonçalves (PI), Altamira do Maranhão (MA) e Vertente do Lério (PE) tiveram índices superiores a 84%, favorecendo principalmente a Contag — Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares.
Quem são os beneficiados pelos descontos
A maioria dos descontos, conforme revelou a CGU, beneficiava a Contag, responsável por 89%, 84% e 91% dos descontos implementados em municípios analisados. Entretanto, ainda não foi determinado quantos desses descontos foram aplicados sem autorização.
A Contag foi alvo de buscas na operação federal autorizada pela Justiça em Brasília. Em nota, a entidade declarou atuar “com ética, responsabilidade” e se disse disposta a colaborar com as investigações. Reforçou ainda o compromisso “com a legalidade e a transparência”.
Estruturas frágeis sob suspeita
Vistorias realizadas pela CGU em oito entidades mostraram graves deficiências. Algumas não possuíam estrutura física ou número adequado de funcionários para atender os aposentados associados.
A AAPPS Universo, por exemplo, localizada em Aracaju (SE), tinha apenas dois colaboradores presentes no momento da vistoria, apesar de declarar mais de 250 mil associados espalhados por todo o Brasil. A estrutura física observada não condizia com o volume de serviços prometidos.
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A entidade afirmou ter entre sete e oito funcionários fixos e colaboradores eventuais. No entanto, a CGU apontou sinais de insuficiência para captar, atender e manter a quantidade de associados alegada.
Atendimento precário e capilaridade duvidosa
Outro caso levantado foi o da Ambec, sediada em São Paulo. Sem espaço para atendimento presencial, a associação prestava suporte exclusivamente via SAC telefônico ou internet.
Durante a vistoria, apenas um auxiliar administrativo foi encontrado, embora a entidade alegasse ter seis funcionários. Mesmo assim, gerenciava uma base de mais de 500 mil aposentados e pensionistas em todo o país.
No site oficial, a Ambec informou disponibilizar atendimentos médicos virtuais e descontos em farmácias. Também anunciou um canal para cancelamento de descontos mensais, já suspensos pelo governo federal.
Presidentes idosos e uso de “laranjas”
Outro dado que chamou a atenção da CGU foi a idade e o perfil dos presidentes de algumas associações. Vários eram aposentados por incapacidade permanente, com baixa renda e pouca experiência de gestão.
A CGU destacou que, em alguns casos, presidentes concederam amplos poderes a terceiros, configurando possíveis “representantes de fachada”. Essa prática poderia mascarar a verdadeira gestão das entidades e o destino dos valores arrecadados.
As suspeitas de má-fé levaram a recomendações de aprofundamento das investigações, ampliando a complexidade do caso.