Ela estava apenas cumprindo a sua rotina diária na manhã desta terça-feira (18), em Bonsucesso, Zona Norte do Rio de Janeiro, conforme muitos brasileiros fazem. Acordou cedo, preparou-se para o trabalho, tomou café, despediu-se do lar, sobretudo da pequena filha Alice Maria, de apenas sete meses. Não sabia que estava cumprindo essa rotina pela última vez. E a frequência com que situações como essa acontecem no Rio de Janeiro, também nos faz refletir se, quando fazemos o mesmo, haverá o dia seguinte.
Deborah Vilas Boas Piras da Silva, de 27 anos, estava num ponto de ônibus, como de costume. Mas perto daquele local, havia um crime em curso. A princípio, uma tentativa de assalto, com quatro criminosos envolvidos. Policiais militares do 22º Batalhão reagiram e teve início uma troca de tiros.
A jovem mulher, que aguardava por um ônibus para ir TRABALHAR, na Barra da Tijuca, certamente não esperava um tiro na testa. Fatal. Ali, morria a alegria e o amor da maternidade, a beleza plena de uma esposa, filha única de seus pais, juntamente com todos os seus sonhos e planos para o futuro. Naquele instante, Wallace Souza ficava viúvo, e Alice Maria, sem mãe. Quiçá a dor de seus progenitores, pela inversão da lógica da criação.
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As inúmeras fotos compartilhadas em sua rede social, revelando sua alegria e amor com a maternidade, da gestação a cada “mêsversário” comemorado de sua bebê comovem qualquer pessoa – inclusive a nós – quando confrontadas com sua morte brutal e estúpida. Nos levam, até mesmo, a questionar a valia da ação policial diante do resultado dela: dois inocentes mortos e um ferido em estado grave.
A violência atravessou a vida da família de Déborah. E ceifou, de igual forma, a vida de um idoso, de 64 anos, dentro de um ônibus, na mesma ação. Situações como essa nos despertam o sentimento de medo e impotência.
Nós, jornalistas, ainda podemos escrever, relatar, cobrar ações e constranger o poder público, conforme tentamos fazer agora, por meio de palavras e através de reportagens. Mesmo que isso nos exponha a riscos, pois nossa atividade não tem proteção especial e sempre estamos sujeitos a lesões ou mortes “acidentais”. Mas e o restante da sociedade? E as pessoas que não gozam de prerrogativas profissionais para isso?
É justamente desses sentimentos de medo e impotência que surge a revolta. E a revolta tem, como resultado, o ódio. Logo, surgem os justiceiros, com suas bravatas e discursos repletos de falácias, que conquistam o eleitorado cansado de ver tanta violência e brutalidade.
Por fim, sabemos que este não se trata do último caso. Daqui a alguns dias, infelizmente, será apenas mais um, pois haverá outros. Mas para Alice Maria, que crescerá sem sua amorosa mãe – e com essa chaga eterna em seu coração – e para o viúvo Wallace, que perde sua companheira e mãe de sua linda filha, ficará a dor da perda, assim como seus pais. Semelhante e lastimosamente igual ao sofrimento de tantas outras famílias.